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25/04/2018 00:00:00 Qual o sentido por trás da doença?
Autor: Dorval de Andrade Tessari¹
A doença não transforma a pessoa em uma vítima, mas impulsiona à tornar-se protagonista de sua própria história. Assim, é como eu entendo a doença. Para explicar melhor essa minha afirmação, eu imagino a vida como se fosse uma free way, construída momento-à-momento, conforme a necessidade do motorista que conduz o carro. Se o motorista estiver atento, a estrada passará por lugares e dará a oportunidade de experienciar cada momento de consciência. Entretanto, se o motorista estiver sonolento, a possibilidade de se colocar em risco, se torna real. Podemos fazer paradas ao longo de nossas vidas para a manutenção. Isso é prudente. Quando não fazemos essas manutenções, quebramos. A essa quebra chama-se doença. Algumas dessas, são de pequenas montas; outras, maiores. Outras tantas, o dano é irreversível.
Assim, inicia-se a caminhada para a cura.
Em relação aos cuidados do ser que adoece estamos passando por um período de extrema polaridade. Injustificadamente, a medicina está sendo criticada. Se de um lado pessoas que se denominam como defensores da ciência estabelecida como se fosse “a verdade” e tomam a arte médica como sendo de sua propriedade, colocando-a como representante de infindáveis interesses nem sempre transparentes, de outro, grupos criticam ferozmente a medicina como se fosse a própria ciência. Nada mais equivocado que essa afirmação. Nessas polaridades, a definição de holismo está completamente deturpado. Nessa guerra estabelecida, o doente fica órfão.
A realidade é uma percepção única e individual, portanto, não sujeita a qualquer forma de julgamento. Somente o vivido é real. O pensamento irracional, aquele que não estabelece relação com a realidade, produz um caos que reflete nas condições corporais. Em tese, a doença é o reflexo de uma condição mental de desordem produzindo modificações físicas. As enfermidades fragmentam o indivíduo separando a estrutura física doente da estrutura mental. Nesse momento de ruptura da integridade há uma conexão, muitas vezes, com mensagens que fazem com que sejam questionadas a própria vida ou o sistema de crenças, uma vez que há a necessidade de buscar uma explicação de como aconteceu essa ruptura. Assim, a enfermidade pode ser considerada como uma oportunidade de reencontro da pessoa doente consigo mesma. Geralmente, um profundo sentimento de auto-reflexão invade a mente. Quanto mais grave for a doença maior será esse processo. As fantasias e a idéia que somos aquilo que queremos ser está na base dessa desestruturação. Se a doença produz uma nítida divisão entre o órgão ou parte de si mesma, supostamente responsável, e a pessoa, a cura passa pela via da conexão entre essas mesmas partes divididas.
Entre tantas possibilidades de restabelecer essa conexão perdida, o Enfoque Holístico da Saúde e das Enfermidades, abordagem psicoterapêutica criada e desenvolvida pela médica psiquiatra chilena Adriana Schnake, propõe recuperar a totalidade do ser humano. Como princípio fundamental, ela traz o conceito que toda a matéria viva tem a capacidade de auto regularizar-se e de completar-se. Sua primeira missão é restituir a integridade dessa visão, fazendo com que a pessoa vivencie essa estrutura, o órgão atingido, e dê-se conta que ele é parte inseparável de si mesma. Quando houver a incorporação dessa vivência, haverá uma mudança de toda a pessoa. Em nenhum momento, busca-se alguma causa ou algum porquê. Não existem questionamentos: aceitamos como os órgãos são ou não contamos com eles.
A técnica proporciona um diálogo entre a pessoa e o órgão afetado. É promovida uma conversa honesta entre as parte envolvidas, dando a oportunidade de esclarecer qualquer mal entendido entre ambas. Vários recursos são acessados para promover essa configuração. Utiliza-se o psicodrama com a finalidade de atuar, acentuando as características dos órgãos ou das pessoas; da anatomia e da fisiologia extrai-se o conhecimento básico para a forma e a função de cada estrutura e os incorpora para vivenciar durante o diálogo; e, da gestalt, utiliza-se o conceito do processo e o princípio organizador que criam ordem dentro do caos e o conceito organísmico de Perls; da psicologia, da filosofia e da neurologia a definição e a conceitualização mais atual do termo consciência; da medicina chinesa tradicional e da medicina ocidental em suas origens, o verdadeiro sentido da cura. Jamais se considera falso o conhecimento anterior estudado. Permite uma melhor qualidade de vida ao fazer com que as pessoas se dêem conta dos aspectos da personalidade que jamais havia se dado conta. Em resumo, é a necessidade de conectar a pessoa consigo mesma.
Nessa técnica, não há conversa diretamente com a enfermidade, pois, assim, a divisão sem acentuaria. Procura, ao contrário, a convergência que desemboca na extraordinária sabedoria do corpo. Não tem a pretensão de reparar o instrumento que somos, somente oportunizar o acesso das pessoas aos elementos que estão presentes dentro delas mesmas e que podem favorecer uma modificação, facilitando todos os meios necessários para conectar-se com a totalidade organísmica.
Objetivando escutar essa parte do corpo que está reclamando e que se distingue de todo o resto, é dado a oportunidade dela se manifestar e querer ser ouvida, porque seguramente a relação entre a pessoa doente com o órgão doente é negativa, e inclui aspectos que o doente não quer reconhecer. Sempre existe uma mensagem nos sintomas e nas enfermidades, uma relação com algum aspecto caracterológico essencial negado ou não assumido pela pessoa. O pilar mestre desta técnica é entender e vivenciar essa verdadeira mensagem da enfermidade.
A verdadeira cura implica em uma transformação, não necessariamente mística mas em um sentido de verdadeiro crescimento, expansão e ampliação de um dar-se conta. Essa proposta terapêutica propõe o restabelecimento da unidade do ser humano como um todo, resgatando a imensa capacidade orgânica de promover sua auto-regulação. A dor, seja ela física ou mental, torna-se menos dolorosa quando se conecta com as características não aceitas do órgão doente e passa, a partir de então, a trabalhar para incorporar na vida do indivíduo. E assim, inicia o processo da cura.
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¹ Presidente da Associação de Medicina Psicossomática do Rio Grande do Sul, Dorval é médico graduado pela Universidade de Caxias do Sul, formado em Hipnose e Psicoterapia Ericksoniana pela The Milton H. Erickson Foudation, Inc. e no Enfoque Holístico de la Salud y la Enfermedad desarrollado por la Dra Adriana Schnake. Atua também como Coordenador da Formação em Psicossomática no Recriar.